7 meses de viagem celebrados em silêncio absoluto

A primeira vez que eu ouvi falar sobre este retiro de meditação Vipassana foi quando estava me preparando para a minha viagem de volta ao mundo e comecei a buscar inspirações para colocar a mochila nas costas e o pé na estrada.

Nesta busca, conheci a Angelina, uma pessoa linda que já vez um monte de viagens pelo mundo e uma delas foi só fazendo trabalho voluntário. Você conversa com ela e sente uma paz, uma calma, e pensa: “eu quero ser assim quando eu crescer”.  E foi ela a primeira pessoa que me recomendou o retiro. Depois disso, quando estava na Tailândia, conheci uma coreana fofa, que meditava 2 vezes por dia no quarto do hostel e me disse que este retiro era uma oportunidade única.

Eu ouvi também que era algo muito difícil, mesmo para quem já praticava algum tipo de meditação, o que não era o meu caso. Porém, eu não conseguia esquecer a fala tranquila da Angelina e o sorriso da coreana. Decidi que eu iria tentar o retiro Vipassana. E para ser bem sincera, eu não fiz grandes pesquisas de como seriam estes 10 dias. Apenas na noite anterior ao início do curso que eu assisti a alguns vídeos no you tube e descobri que eu ficaria sem jantar por 10 dias, o que me deixou bem preocupada.

Os dois primeiros dias foram bem tranquilos, por que tudo era novidade, eu estava achando divertido não poder falar, não ter nenhuma preocupação (onde vou dormir amanhã, o que comer, pesquisar meus próximos destinos, estas coisas). Mas no terceiro dia, comecei a ficar mais tensa, comecei a contar quantos dias faltavam para acabar, comecei a pensar em desistir.

Eu achava que ficar tanto tempo sentada meditando seria a parte mais difícil, mas por incrível que pareça, até que me sai bem, fui melhorando a cada dia. Na técnica Vipassana, você tem que ficar pelo menos 1 hora sem se mexer, apenas observando as sensações do seu corpo (de forma bem resumida). Até o sexto dia, isso parecia impossível, quando dava uns 30 minutos meditando, eu olhava para o relógio e a partir daí, cada minuto parecia uma eternidade. Mas de tanto S. N. Goenka repetir que deveríamos ser “os nossos próprios mestres”, no sétimo dia eu dei um basta para este mimimi da minha mente e comecei a ficar 1 hora sem olhar no relógio. A sensação de conseguir ficar a hora inteira de olhos fechados, um pouco meditado e muito tempo pensando em “n” coisas, era muito boa. Rolou um empoderamento.

Mas o que quase me deixou realmente louca foi o período de ociosidade e a falta de contato com o mundo de fora. Minha mãe sempre me disse que cabeça vazia é oficina do diabo. E conclui que ela está coberta de razão. Nos meus momentos de ócio eu percebi como era bem mais fácil eu pensar em coisa ruim do que em coisa boa. Só para vocês terem uma idéia, teve um dia que eu cismei com uma pinta que estou na sola do pé. Colocava a lanterna e ficava examinando, lembrei que pinta no pé pode ser câncer de pele e já imaginei coisas terríveis para o meu futuro. Sem dúvida alguma, foi neste período fora da meditação que eu tive que ser a tal mestra da minha mente. Até quando vinha aquela vontade de desistir, eu jogava comigo mesmo: “ok,  Camilla. Vamos só terminar o dia de hoje e amanhã você desiste”. No quinto dia,  fui dar uma choradinha para a professora, mas ela só me olhou com aquele sorriso sereno e falou: “continue tentanto”. E fui assim até o final.

Ficar sem contato com o mundo de fora foi dolorido. Sem nenhum livro em mãos, celular ou computador, fui obrigada a olhar mais para dentro  (e vi coisas terríveis!). Vivemos em eterna negacão de algumas facetas do nosso ser, preferimos acreditar que somos aquele ser que gostaríamos de ser e não o que realmente somos. Tive um contato bem pertinho com meu lado escuro, vi muitas fraquezas, raiva, ciúmes, necessidade de controle, tudo que eu aprendi na vida que é muito feio sentir! E atualmente ando num processo muito interessante de me aceitar como ser humano imperfeito que sou.

Apesar da minha fé incondicional em Deus, que na minha visão pode ter diferentes nomes, eu sempre tive dificuldade de me encontrar em uma determinada religião. Para mim, religião é algo criado por seres humanos e só este fato traz inúmeras contaminações. E nos  ensinamentos da Vipassana, eu encontrei um bom caminho para cultivar minha espiritualidade independentemente de qualquer religião. É o caminho de buscar paz dentro de si e não no mundo exterior. É a busca incessante de Dhamma, que é a lei da natureza. Isso é muito lindo e muito poderoso. Me sinto cada dia mais conectada com esta força sobrenatural que banha o Universo e com fé que a gente recebe aquilo que a gente emana. E mesmo quando a gente recebe umas coisas não muito legais dessa montanha russa que se chama Vida, o negócio é aguentar firme e seguir. SEMPRE.

E foi no décimo dia do retiro que completei meus 7 meses de viagem na maior alegria de ter conseguido ir até o final!

Desejo muita Metta (Amor) para todos vocês!

9 Comments 7 meses de viagem celebrados em silêncio absoluto

  1. Marcel Otavio Cerri 23 de maio de 2016 at 14:51

    Oi Camila,
    Tenho ficado com mais vontade de ler mais sobre as suas aventuras e cada post seu uma lição. Obrigado por compartilhar conosco.
    Beijos e muito amor.

    Reply
    1. Camilla Albani 31 de maio de 2016 at 16:03

      obrigada Marcel! estas mensagens de vocês me anima a escrever mais! muito amor! 🙂 bjks

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  2. Dri Salles 23 de maio de 2016 at 16:20

    Ca! Que bom que você ficou até o final, é difícil sim, mas é um experiência incrível. Eu tive várias dificuldades e me identifiquei muito com o que vc falou sobre os eus interiores, sobre os sentimentos que acabamos descobrindo ali dentro e que negamos que eles existem. Eu entrei numa de que eu era uma pessoa péssima, mas em busca de me tornar alguém melhor. Depois vi que não era tão ruim assim, que era humana, imperfeita, com defeitos e com qualidades. E confesso que amei o silêncio! Não sei como, eu sou super falante, mas calar durante 10 dias me fez um bem enorme!
    Quero fazer outros! E receba minhas melhores vibrações na sua viagem!
    Um beijo,
    Dri

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    1. Camilla Albani 31 de maio de 2016 at 16:03

      Dri, sabe que as vezes eu tenho saudades do silêncio? Acho que vou fazer alguns dias “do silêncio” hehehe. Obrigada! e muitos beijos!

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  3. Sueli 23 de maio de 2016 at 21:24

    Camila, amo ler seus post’s! Lindas descrições das suas magníficas experiências, ricas em detalhes, relatos plenos de sinceridade e em linguagem perfeita!
    Parabéns, menina! Que tudo continue indo muito bem! Siga em paz, sob a proteção de Deus! Beijos!

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    1. Camilla Albani 31 de maio de 2016 at 16:00

      obrigada querida!!! super beijo! assim que inspiro para escrever mais e mais!

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  4. Rodrigo 31 de maio de 2016 at 15:33

    Fantásticas reflexões! Gostei muito do post sobre o Overland também que você enviou recentemente! Parabéns. Cada vez melhores e mais apaixonados esses relatos. Muito bom mesmo! 🙂

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    1. Camilla Albani 31 de maio de 2016 at 15:57

      obrigada Zago! o elogio vindo do escritor Rodrigo Zago, eu até fico me achando! hehehe saudades! em breve estou aí no Rio para refletirmos juntos tomando uma gelada! 🙂 Beijokas!!!

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  5. Ney Duarte 5 de novembro de 2016 at 22:16

    Parabéns pelo lindo relato, fiquei curioso para ter uma experiência como está ou parecida.
    Vou acompanhar seu blog.
    Bjs

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